Reavaliação não era feita desde 2019 e, agora, promete alcançar cerca de 800 mil beneficiários da Previdência Social
A realização de uma operação pente-fino em benefícios previdenciários temporários, anunciada pelo ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, na sexta-feira (5), deve criar um cenário de incerteza aos beneficiários, que dependem dos desembolsos para a manutenção do próprio sustento, apontam especialistas ouvidos pelo InfoMoney.
Segundo informações de Lupi, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e o ministério vão iniciar, nas próximas semanas, uma reavaliação de ao menos 800 mil beneficiários de auxílio por incapacidade temporária e auxílio-doença — a medida deve começar em agosto. Segundo o ministro, há previsão de que esse tipo de revisão seja realizada a cada dois anos. Entretanto, o processo não era feito desde 2019.
Nestas operações, diversos benefícios podem ser cessados, porque são temporários mesmo. Mas, de acordo com a advogada previdenciária Maria Faiock, o processo é gradativo e não haverá convocação automática de todo mundo. “Nem todos precisarão ser chamados para perícia presencial, pois alguns casos serão resolvidos somente com o cruzamento de dados cadastrais”, explica.
No entanto, o risco de perder o benefício ronda. “É importante manter o cadastro e os documentos atualizados para uma eventual convocação. Caso a cessação for indevida, é importante buscar um advogado especialista em previdência para ajuizar ação de restabelecimento de benefício o quanto antes”, acrescenta.
A última vez que foram revistos os benefícios temporários, em 2019, cerca de 170 mil pagamentos foram encerrados. Na época, o governo estimou que deixaria de gastar cerca de R$ 2,1 bilhões com os benefícios cessados.
Embora o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tenha anunciado nesta semana que já foi possível identificar um montante de R$ 25,9 bilhões que poderão ser cortados no orçamento do próximo ano — pela revisão de cadastros de programas sociais também de outros ministérios —, Lupi evitou se comprometer com valores ao falar sobre o assunto.
O ministro só disse que benefícios serão cortados de quem não tiver mais o direito, mas declarou que não haverá “tribunal de inquisição” e que discutir “despesa com ser humano seria insensibilidade”. Para interlocutores da equipe econômica, entretanto, o discurso de Lupi é político, no sentido de jogar com o público, porque ele está ciente do diagnóstico sobre a redução de despesas e tudo foi negociado internamente.
A advogada Daniela Poli Vlavianos, sócia do escritório Poli Advogados & Associados, explica que quando a Previdência precisa reduzir custos realiza essas operações de revisão do Benefício Prestação Continuada (BPC), seguida pelo auxílio-doença.
E sempre é exigida uma nova perícia médica aos beneficiários que estão há mais de um ano recebendo os pagamentos. “O seguro defeso, que beneficia pescadores artesanais durante os períodos de proibição da pesca para preservação das espécies, também será revisado para garantir que os pagamentos sejam feitos apenas a quem realmente tem direito”, explica.
Tudo isso é uma tentativa do governo de tornar o sistema previdenciário mais eficiente, evitando fraudes e pagamentos indevidos. “A operação pente-fino, portanto, é um equilíbrio delicado entre a necessidade de cortar gastos públicos e a proteção social dos cidadãos mais vulneráveis”, acrescenta Daniela.
Para evitar o risco de receber uma intimação e não comparecer à agência para prestar os esclarecimentos, resultando no cancelamento do pagamento, os beneficiários de programas previdenciários precisam manter seus cadastros atualizados junto aos órgãos públicos, especialmente no INSS, reforça a advogada Luciana Simões de Souza, chefe das áreas fiscal e previdenciária do escritório Andrade Foz Advogados.
O advogado Mozar Carvalho, fundador da Mozar Carvalho Advocacia, ressalta que os riscos nessas operações podem variar dependendo do tipo de benefício do qual o indivíduo é beneficiário. “No caso do BPC, por exemplo, é possível que os beneficiários enfrentem uma maior avaliação de suas condições financeiras e de saúde para garantir que atendam aos critérios de elegibilidade, podendo até resultar na suspensão ou cancelamento do benefício caso seja constatado que o beneficiário não se enquadra mais nos requisitos exigidos”, afirma.
Quanto ao auxílio-doença, geralmente os beneficiários são submetidos a uma revisão médica mais criteriosa para verificar se ainda apresentam incapacidade para o trabalho. “No caso de se constatar que o beneficiário está apto para retornar ao trabalho, o benefício poderá ser suspenso ou cessado”, diz Carvalho.
Durante o evento de celebração dos 34 anos do INSS, Lupi disse que a pasta está dando uma “grande contribuição” para o ministério da Fazenda com ações relativas ao sistema Atestmed e a reavaliação de benefícios, que será iniciada neste segundo semestre.
“O que estamos fazendo com muita eficiência, em uma grande contribuição para a Fazenda, é economizando em vários setores, como a racionalização do Atestmed. E agora estamos começando um sistema de triagem, de apuração de possíveis irregularidades, para corrigir rumos”, comentou sem anunciar meta de economia com a revisão.
“É uma checagem de possíveis irregularidades. Por exemplo: todos que têm mais de dois anos de benefício têm necessidade de fazer novo exame para saber se continua tendo aquele direito temporário”, disse Lupi.
Junto ao ministro, o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, disse ainda que o órgão espera alcançar a meta de redução de gasto de R$ 9,05 bilhões neste ano, a partir das medidas de revisão e produtividade. Ele pontuou, por sua vez, que o INSS “não tem compromisso de cancelar 10 mil benefícios, 100 mil benefícios”.
“Confirmando a irregularidade, tem que ser cancelado, porque precisamos ter recursos para pagar a quem tem direito”, disse.
Lupi também foi perguntado sobre a previsão trazida no projeto de lei de diretrizes orçamentárias de 2025, de economia potencial próxima de R$ 7,2 bilhões em benefícios previdenciários. Mas também evitou comentar o número. “Não gosto de fazer avaliação de número sem ter alguma coisa concreta, eu acho que esse ano será maior do que era previsto, e a gente se aperfeiçoando a tendência é ser sempre um volume grande”, disse o ministro. Segundo ele, no primeiro semestre, o uso do Atestmed já possibilitou uma economia de R$ 1 bilhão a R$ 2 bilhões para a Previdência.
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